quinta-feira, 7 de abril de 2011
Comentario do aluno
Meu comentario sobre o livro quatro contos relada uma pura emoção na história da carta roubada para saber quem robou a carta dos aposentos . Antes de ler o livro , eu percebi que não iria gostar do livro , mas faleu a pena que o livro quatro contos é uma pura aventura e romace .
Coméntario da Família
Minha família acho que o livro quatro relada uma história de puro romance entre o casal Della e Jim é os misterio da carta roubada , sociedade dos ruivos e Rip Van Winkle .O livro traz a inteligencia e convivencia dos personagens reunidos , o livro traz palavras faceis de entender e 62 paginas de puro romance .
Biografia dos autores
O.HENRY - Nasceu em 1862, na Carolina do Norte, e faleceu em 1910, em Nova York. De origem pobre [estudou sozinho, por si mesmo], passou anos de dificuldades econômicas. Foi preso e começou a escrever contos,publicados no jornais,obtiveram grande sucesso.
Edgar Allan Poe - Nasceu em 1809, filho de um casal de atores pobres. Criado pelo rico comerciante John Allan [de quem adotaria o nome], teve uma educação primorosa e foi desde cedo notado pelo talento extraordinário, a um caráter difícil e rebelde, causa de sua expulsão de vários colégios.
Arthur Conan Doyle - [1859-1930] nasceu em Edimburgo [Escócia] e morreu em Cowborough [Inglaterra]. Diplomou-se em medicina e exerceu a profissão durante algum tempo. Escreveu romances históricos e estudo sobre fenômenos paranormais, mas seu sucesso como escritor deveu-se a suas novelas policiais.
Washington Irving - [1783-1859] era filho de um rico comerciante de Nova York. Encaminhou-se para o estudo do direito, mas logo revelou seu gosto pelas viagens e pela atividade literária. Viveu dezessete anos na Inglaterra e foi embaixador dos Estados Unidos na Espanha, país que é cenário de várias de suas narrativas.
Edgar Allan Poe - Nasceu em 1809, filho de um casal de atores pobres. Criado pelo rico comerciante John Allan [de quem adotaria o nome], teve uma educação primorosa e foi desde cedo notado pelo talento extraordinário, a um caráter difícil e rebelde, causa de sua expulsão de vários colégios.
Arthur Conan Doyle - [1859-1930] nasceu em Edimburgo [Escócia] e morreu em Cowborough [Inglaterra]. Diplomou-se em medicina e exerceu a profissão durante algum tempo. Escreveu romances históricos e estudo sobre fenômenos paranormais, mas seu sucesso como escritor deveu-se a suas novelas policiais.
Washington Irving - [1783-1859] era filho de um rico comerciante de Nova York. Encaminhou-se para o estudo do direito, mas logo revelou seu gosto pelas viagens e pela atividade literária. Viveu dezessete anos na Inglaterra e foi embaixador dos Estados Unidos na Espanha, país que é cenário de várias de suas narrativas.
Apresentação de Washington Irving
Rip Van Winkle
Washington Irving
Adaptação de Paulo Sérgio de Vasconcello
Quem quer que tenha subido pelo rio Hudson deve lembrar-se das montanhas Kaatskill, que se avistam ao longe. Cada mudança de estação e de tempo e cada hora do dia provocam alguma mudança nas cores e nos contornos mágicos dessas montanhas. Todas as boas esposas da região as tomam como barômetros, pois, de acordo com sua aparência, conseguem prever o tempo.
Ao pé dessas belas montanhas, o viajante pode avistar fumaça se erguendo lentamente de uma aldeia cujos telhados brilham por entre as árvores. É uma aldeia muito antiga, que foi fundada por algum colonizador holandês.
Nessa aldeia e em uma dessas casas (que, a bem da verdade, eram muito antigas e castigadas pelo mau tempo), vivia, há muitos anos, quando os Estados Unidos ainda eram uma província da Grã-Bretanha, um homem simples e bom chamado Rip Van Winkle.
Era um vizinho exemplar e um marido obediente, completamente dominado pela mulher. Certamente devia a essa última circunstância a brandura de alma que lhe conquistava uma popularidade geral, pois são mais aptos a serem dóceis e conciliadores fora, esses homens que estão sob a disciplina de uma víbora dentro de casa.
Rip Van Winkle era o grande favorito entre todas as boas esposas da aldeia; as crianças também gritavam de alegria sempre que ele se aproximava. Assistia a seus jogos, fabricava seus brinquedos, ensinava-lhes a soltar pipa e atirar bolinhas de gude e lhes contava longas histórias de fantasmas, bruxas e índios. Aonde quer que ele fosse, era cercado por um bando deles, pendurando-se nas suas roupas, subindo às suas costas e lhe pregando mil peças
impunemente. Nem um cachorro sequer, em toda a redondeza, latia para ele.
O grande defeito de caráter de Rip era uma insuperável aversão a qualquer tipo de trabalho útil. Não era falta de assiduidade ou perseverança, pois ele seria capaz de sentar numa rocha úmida, com uma vara, e ficar pescando o dia todo, sem uma queixa, mesmo que sua isca não fosse mordida nem uma só vez.
Carregaria ao ombro sua espingarda por horas seguidas, caminhando por bosques e pântanos, subindo e descendo morros, para atirar em alguns poucos esquilos ou pombas selvagens. Jamais
se recusaria a ajudar um vizinho, mesmo nas tarefas mais duras. As mulheres da aldeia, também, tinham o costume de recorrer a ele para pequenos serviços que seus maridos menos prestativos não fariam por elas. Numa palavra, Rip estava sempre pronto para
cuidar dos negócios de quem quer que fosse, exceto dos dele próprio. Mas cumprir os deveres para com a família e manter sua fazenda em ordem, ele achava impossível.
De fato, dizia que não adiantava nada trabalhar em sua fazenda: era o pior pedaço de terra de toda a região. Tudo ali dava errado e daria errado apesar dele. Suas cercas estavam sempre
caindo aos pedaços; sua vaca sempre se perdia ou ia parar na plantação de couve. A erva-daninha certamente crescia mais rápido em suas terras do que em nenhum outro lugar. A chuva fazia questão de cair exatamente quando ele tinha algum trabalho para fazer ao ar livre. Assim, a propriedade que herdara do pai, diminuindo até ficar reduzida a pouco mais que um simples terreno com milho e batatas, era a fazenda em piores condições de toda a
redondeza.
Seus filhos também andavam maltrapilhos e selvagens como se não tivessem pais. Seu filho Rip, um moleque igualzinho a ele, fazia prever que ia herdar-lhe os hábitos, junto com as suas roupas velhas. Viam-no geralmente correndo como um potro atrás da mãe,
vestido com um velho par de calças do pai, que ele tinha muita dificuldade em segurar com uma mão.
Rip Van Winkle, porém, era um desses felizes mortais bemhumorados, sempre de bem com a vida, comendo pão branco ou preto: o que se pudesse conseguir com menor esforço ou
dificuldade. Preferia definhar com um centavo a trabalhar por uma libra. Se deixado a si mesmo, ele teria passado a vida a assobiar, com perfeita satisfação; mas sua mulher vivia resmungando nos seus ouvidos sobre sua preguiça, sua negligência e a ruína a que ele
estava levando sua família. De manhã, à tarde e à noite, sua língua estava em ação sem trégua, reclamando de tudo o que ele dizia ou fazia. Rip só tinha um modo de responder: encolhia os ombros, balançava a cabeça, erguia os olhos, mas não dizia nada. Isso,
porém, provocava uma nova enxurrada de queixas e só lhe restava, então, ir para fora de casa — o único lugar que realmente pertence a um marido dominado pela esposa.
O único a tomar partido de Rip em seu lar era seu cachorro Wolf, tão tiranizado pela Senhora Van Winkle quanto seu dono, pois aquela os via como companheiros de preguiça e olhava torto para Wolf como se ele fosse a causa das perambulagens freqüentes do
marido. A verdade é que Wolf era, sob todos os aspectos, um cachorro digno; era corajoso — mas que coragem podia enfrentar os constantes e esmagadores ataques de uma língua de mulher? Assim que Wolf entrava na casa, baixava a crista, com
o rabo entre as pernas, olhando atentamente para a senhora Van Winkle. Ao primeiro sacudir de um cabo de vassoura ou de uma concha, saía correndo para a porta, latindo.
Foi ficando pior para Rip Van Winkle com o passar dos anos de casamento. Um temperamento azedo jamais se abranda com o tempo, e uma língua afiada é o único instrumento cortante que se torna mais agudo com o uso constante. Por muito tempo, ele costumava consolar-se, ao ser expulso de casa, freqüentando uma espécie de clube dos sábios, filósofos e outros personagens preguiçosos da aldeia. Suas sessões ocorriam num banco na frente
de uma pequena pousada. Ali costumavam se sentar à sombra, durante um longo e preguiçoso dia de verão, conversando distraidamente sobre mexericos da aldeia ou contando histórias intermináveis e tediosas sobre coisa nenhuma. Se lhes caía nas
mãos algum jornal deixado por um viajante de passagem, era lido arrastadamente por Derrick Van Bummel, o mestre-escola, um homenzinho vivo e instruído, que não se deixava assustar pela palavra mais gigantesca do dicionário. Como deliberavam sabiamente sobre acontecimentos públicos alguns meses depois que eles tinham ocorrido!
As opiniões dessa liga eram totalmente controladas por Nicholas Vedder, um patriarca da aldeia e dono da pousada, a cuja porta ele permanecia sentado de manhã até a noite, só se movendo para evitar o sol e continuar sob a sombra de uma grande árvore.
Assim, os vizinhos podiam saber que horas eram a partir de seus movimentos, de uma forma tão precisa quanto consultando um relógio de sol. É verdade que raramente escutavam-no a falar, mas fumava seu cachimbo sem parar. Seus partidários, porém, compreendiam-no perfeitamente o que ia pela sua cabeça, de acordo com o modo como ele fumava.
Mas até mesmo desse refúgio o desafortunado Rip foi por fim expulso pela megera da sua esposa, que irrompeu de repente na tranqüilidade da assembléia e chamou todos os seus membros de inúteis. Nem aquela venerável personagem, o próprio Nicholas
Vedder, foi poupado da língua atrevida dessa terrível víbora, que o acusava de encorajar os hábitos preguiçosos do marido.
O pobre Rip se viu por fim quase reduzido ao desespero; e sua única alternativa para escapar do trabalho da fazenda e da gritaria da mulher era pegar sua espingarda e perambular pelas florestas. Aqui ele algumas vezes se sentava ao pé de uma árvore e
dividia o conteúdo de sua bolsa com Wolf, com quem simpatizava como um companheiro de sofrimento. “Pobre Wolf”, dizia, “sua dona dá a você uma vida de cão, mas não se preocupe, meu amigo: enquanto eu viver, você nunca sentirá falta de um companheiro para ficar a seu lado!” Wolf abanava o rabo, olhava atentamente para o rosto do seu dono e, se cães podem sentir piedade, eu acredito realmente que ele demonstrava os mesmos sentimentos do
dono com todo seu coração.
Numa dessas longas andanças, num belo dia de outono, tinha escalado, sem dar por isso, uma das partes mais altas das montanhas Kaatskill. Estava entretido em seu esporte favorito —
caçar esquilos, e a solidão silenciosa das rochas tinha ecoado repetidamente os estampidos de sua espingarda. Ofegante e cansado, lançou-se sobre uma colina verde, à beira de um precipício. De uma abertura entre as árvores ele podia avistar toda
a região mais abaixo, a grande distância. Viu o altivo Hudson, longe, longe, movendo-se em seu curso silencioso mas majestoso.
Do outro lado, avistou um vale profundo, selvagem, solitário e eriçado; o fundo estava repleto de pedaços de rochas e escassamente iluminado pelos reflexos do sol poente. Por algum
tempo Rip permaneceu ali, deitado, meditando sobre aquela cena.
A noite estava avançando pouco a pouco. As montanhas começavam a lançar suas sombras azuis sobre os vales. Ele viu que escureceria muito antes de poder chegar à aldeia e suspirou profundamente ao pensar nas ameaças da Senhora Van Winkle que
ele teria de enfrentar.
A ponto de descer, ouviu uma voz chamando-o: “Rip Van Winkle! Rip Van Winkle!” Olhou ao redor, mas não conseguiu ver nada além de um corvo num vôo solitário através da montanha. Pensou que sua imaginação o enganara e se preparou de novo para descer, quando ouviu o mesmo grito soar através do calmo ar da noite: “Rip Van Winkle! Rip Van Winkle!” No mesmo momento, Wolf eriçou os pêlos das costas e, dando um fraco rosnado, refugiou-se bem junto do dono, olhando assustado para o vale. Rip agora sentia uma vaga apreensão. Olhou ansiosamente na mesma direção e percebeu uma figura estranha escalando vagarosamente as rochas e curvada sob o peso de algo que carregava às costas. Ele ficou surpreso ao ver um ser humano naquele lugar solitário e deserto, mas julgando que era algum dos vizinhos precisando de sua ajuda, correu a oferecê-la.
Ao chegar mais perto, ficou ainda mais espantado com a singularidade da aparência do estranho. Era um velho baixo, de fartos cabelos eriçados e barba grisalha. Vestia-se à antiga moda holandesa, com uma jaqueta e vários calções. Carregava aos
ombros um barril, que parecia cheio de licor, e fazia sinais a Rip para que ele se aproximasse e ajudasse com o fardo. Embora ressabiado e desconfiado dessa nova amizade, Rip o fez com sua presteza habitual. Ajudando-se um ao outro, subiram um barranco,
que parecia o leito seco de uma corrente da montanha. Quando escalavam, Rip ouviu um barulho como que de um trovão distante.
Parou por um momento, mas supondo que era um desses trovões que anunciam uma pancada de água, prosseguiu. Chegaram a uma cavidade que parecia um pequeno anfiteatro, cercado por precipícios e árvores. Durante todo o tempo, Rip e seu companheiro tinham subido a montanha em silêncio. Embora o primeiro se perguntasse admirado qual a razão de se carregar um barril de licor montanha acima, havia algo estranho e incompreensível no desconhecido que inspirava medo e impedia a intimidade da conversa.
Ao entrarem no anfiteatro, apareceram outros motivos de espanto. No centro havia um grupo de homens esquisitos jogando um antigo jogo de bola holandês. Vestiam, todos, roupas estranhas.
Seus rostos, também, eram especiais. Um tinha uma grande barba, rosto cheio e olhinhos de porco. A face de um outro parecia consistir inteiramente num nariz, encimado por um chapéu branco com uma pena vermelha de galo. Todos tinham barba, de vários formatos e cores. Havia um que parecia ser o líder. Era um velho forte; tinha um chapéu com penas, meias vermelhas e sapatos de salto alto, com rosas. O grupo em seu conjunto lembrava a Rip as
figuras de uma velha pintura flamenga, que ele vira na sala de Dominic Van Shaick, o vigário da aldeia, trazida da Holanda no tempo da colonização.
O que parecia particularmente estranho a Rip era que, embora aquelas pessoas estivessem se divertindo, mantinham no rosto uma expressão das mais sérias, o mais misterioso silêncio: era a diversão mais melancólica que ele já tinha testemunhado. Nada interrompia o silêncio da cena, exceto o ruído das bolas, que, ao rolar, ecoavam através das montanhas como barulho de trovão.
Quando Rip e seu companheiro se aproximaram, eles de repente desistiram do seu jogo e o encararam com um olhar tão fixo de estátua e com rostos tão estranhos e sem vida, que seu coração disparou e seus joelhos se chocaram entre si. Seu companheiro esvaziava agora o conteúdo do barril em garrafões e fazia sinais para que ele servisse o grupo. Obedeceu com medo e tremendo; eles beberam o licor em profundo silêncio e retornaram
ao jogo.
Pouco a pouco o medo e a apreensão de Rip diminuíram. Até se aventurou, quando nenhum olhar estava fixado nele, a saborear o licor, que tinha o gosto das melhores bebidas holandesas. Era, por natureza, uma alma sedenta e logo se viu tentado a repetir a dose. Um gole leva a outro, e ele repetiu suas visitas ao garrafão tantas vezes que, por fim, seus sentidos se enfraqueceram, seus olhos se turvaram, sua cabeça foi gradualmente tombando e ele caiu num sono profundo.
Ao acordar, descobriu-se na colina verde de onde tinha visto pela primeira vez o velho que vinha subindo a montanha. Esfregou os olhos — era uma esplêndida manhã ensolarada. Pássaros
Pouco a pouco o medo e a apreensão de Rip diminuíram. Até se aventurou, quando nenhum olhar estava fixado nele, a saborear o licor, que tinha o gosto das melhores bebidas holandesas. Era, por natureza, uma alma sedenta e logo se viu tentado a repetir a dose. Um gole leva a outro, e ele repetiu suas visitas ao garrafão tantas vezes que, por fim, seus sentidos se enfraqueceram, seus olhos se turvaram, sua cabeça foi gradualmente tombando e ele caiu num sono profundo.
Ao acordar, descobriu-se na colina verde de onde tinha visto pela primeira vez o velho que vinha subindo a montanha. Esfregou os olhos — era uma esplêndida manhã ensolarada. Pássaros
saltitavam e cantavam por entre a mata. “Com certeza”, pensou Rip, “não devo ter dormido aqui a noite toda”. Recordou o que acontecera antes de adormecer. O homem estranho com um barril de licor, o barranco, o retiro selvagem entre as rochas, o triste jogo de bola, o garrafão. “Oh!, aquele garrafão! Maldito garrafão!”, pensou Rip, “quantas desculpas eu devo pedir à Senhora Van Winkle!”
Procurou por sua arma, mas em seu lugar encontrou apenas uma espingarda toda corroída de ferrugem. Suspeitava agora de que os homens da montanha tinham lhe pregado uma peça: depois de o embebedar com o licor, tinham roubado sua espingarda.
Também Wolf tinha desaparecido, mas bem podia ter corrido atrás de um esquilo ou de uma perdiz. Assobiou chamando-o e gritou seu nome, mas tudo em vão; os ecos repetiam seu assobio e grito, mas não se viu nenhum cachorro.
Decidiu revisitar a cena do dia anterior e, se encontrasse alguém do jogo, pedir seu cachorro e sua espingarda. Ao se erguer, notou que suas juntas estavam rígidas e mais fracas do que o normal. “Essas camas de montanha não são comigo”, pensou Rip, “e se eu ficar com reumatismo, terei de agüentar a Senhora Van Winkle por um bom tempo”. Com alguma dificuldade, desceu ao barranco onde tinha estado com o companheiro na véspera. Mas,
para seu espanto, havia agora ali uma corrente de água da montanha, saltando de rocha a rocha.
Por fim, chegou ao que era o anfiteatro, mas não encontrou nenhum sinal da escavação que havia antes. As rochas apresentavam uma parede alta, intransponível, sobre a qual corriam as águas, rodeadas pelas sombras de uma floresta. Aqui, então, o pobre Rip foi obrigado a parar. De novo assobiou e chamou pelo cão, inutilmente. Que deveria fazer? A manhã já ia alta, e Rip, sentindo falta do café da manhã, sentia-se faminto. Lamentava deixar seu cachorro e sua espingarda, temia encontrar a esposa, mas não podia morrer de fome nas montanhas. Sacudiu a cabeça, pôs no ombro a espingarda enferrujada e, com o coração cheio de
Por fim, chegou ao que era o anfiteatro, mas não encontrou nenhum sinal da escavação que havia antes. As rochas apresentavam uma parede alta, intransponível, sobre a qual corriam as águas, rodeadas pelas sombras de uma floresta. Aqui, então, o pobre Rip foi obrigado a parar. De novo assobiou e chamou pelo cão, inutilmente. Que deveria fazer? A manhã já ia alta, e Rip, sentindo falta do café da manhã, sentia-se faminto. Lamentava deixar seu cachorro e sua espingarda, temia encontrar a esposa, mas não podia morrer de fome nas montanhas. Sacudiu a cabeça, pôs no ombro a espingarda enferrujada e, com o coração cheio de
preocupação e ansiedade, dirigiu seus passos para casa.
Ao se aproximar da aldeia, encontrou algumas pessoas, mas nenhuma conhecida, o que o surpreendeu um bocado, pois achava que conhecia todos na região. Também suas roupas eram de um tipo diferente daquele com o qual ele estava acostumado. Todos olhavam fixamente para ele, com os mesmos sinais de espanto, e coçavam o queixo. A repetição constante desse gesto levou Rip a fazer involuntariamente o mesmo e foi quando, para sua surpresa, descobriu que sua barba tinha crescido um pé!
Agora, tinha chegado aos limites da aldeia. Um grupo de crianças desconhecidas correu atrás dele, gritando e apontando sua barba grisalha. Também os cães, que ele não reconheceu, latiam para ele à sua passagem. Toda a aldeia tinha mudado. Estava maior e mais povoada. Havia fileiras de casas que ele jamais tinha visto antes e as que lhe eram familiares tinham desaparecido. Havia nomes desconhecidos sobre as portas, rostos desconhecidos às janelas; tudo era desconhecido. Duvidava do seu próprio juízo; começou a achar que talvez ele e o mundo a sua volta estivessem enfeitiçados. Certamente esta era sua aldeia natal, que ele deixara
na véspera. Ali se erguiam as montanhas Kaatskill, ali corria o prateado Hudson. Rip estava dolorosamente perplexo. “Aquele garrafão de ontem à noite”, pensou, “perturbou a minha pobre cabecinha!”
Foi com alguma dificuldade que encontrou o caminho para sua casa, da qual ele se aproximou com medo silencioso, esperando a cada momento ouvir a voz estridente da Senhora Van Winkle.
Encontrou a casa em ruínas: o teto caído, as janelas arrebentadas e as portas fora das dobradiças. Um cão meio morto de fome, que se parecia com Wolf, vagava por ali. Rip chamou-lhe pelo nome, mas o vira-lata rosnou, mostrou os dentes e foi embora. “Até o meu próprio cachorro”, suspirou o pobre Rip, “esqueceu-se de mim!”
Entrou na casa. Estava vazia e, segundo parecia, abandonada.
Chamou em voz alta pela esposa e filhos — os aposentos desertos ressoaram com sua voz por um momento e, então, tudo voltou ao silêncio de antes.
Correu para o seu velho refúgio, a pousada da aldeia — mas ela também tinha desaparecido. Estava em seu lugar uma construção de janelas largas, sobre cuja porta estava pintado:
“Hotel União, de Jonathan Doolittle”. Ao invés da grande árvore que costumava proteger a calma pousada holandesa, havia um mastro com uma bandeira; nela, uma estranha mistura de estrelas e listras — tudo isso era incompreensível e estranho.
Havia, como sempre, uma multidão de pessoas perto da porta, mas nenhuma que Rip reconhecesse. Até o caráter do povo parecia mudado. Ao invés da calma habitual, as pessoas eram apressadas e agitadas. Procurou em vão pelo sábio Nicholas Vedder ou por Van
Bummel, o mestre-escola.
Rip, com sua longa barba grisalha, sua espingarda enferrujada, sua roupa grosseira logo atraiu a atenção dos homens do hotel. Cercaram-no, olhando-o dos pés à cabeça com grande curiosidade. Perguntaram em quem ele tinha votado. Rip arregalou os olhos, sem entender nada. Um homem puxou-o pelo braço e perguntou se ele era federalista ou democrata. Rip não conseguia entender a pergunta. Por fim um velho lhe perguntou, em tom grave, o que ele fazia numa eleição com uma arma ao ombro e uma multidão a segui-lo e se ele queria liderar uma revolta na aldeia.
“Ai!, senhores”, exclamou Rip, “eu sou um pobre coitado, pacífico, natural deste lugar”. E o pobre homem assegurou, humildemente, que não pretendia armar confusão mas que viera ali apenas para procurar alguns dos seus vizinhos, que costumavam reunir-se
“Ai!, senhores”, exclamou Rip, “eu sou um pobre coitado, pacífico, natural deste lugar”. E o pobre homem assegurou, humildemente, que não pretendia armar confusão mas que viera ali apenas para procurar alguns dos seus vizinhos, que costumavam reunir-se
naquele lugar.
“Bem, quem são eles?”, ouviu-se perguntar, “Diga seus nomes”.
Rip pensou por um momento e indagou: “Onde está Nicholas Vedder?”
Houve silêncio por um instante, até que um velho respondeu: “Nicholas Vedder? Está morto e enterrado há dezoito anos! Havia uma lápide de madeira, no cemitério, que contava tudo sobre ele, mas apodreceu e sumiu”.
“Onde está Brom Dutcher?”
“Oh, alistou-se no exército, logo no começo da guerra; uns dizem que ele morreu em combate, outros que se afogou. Não sei, ele nunca mais voltou”.
“Onde está Van Bummel, o mestre-escola?”
“Alistou-se também, foi um grande general e agora está no Congresso”.
O coração de Rip se partiu ao ouvir essas tristes mudanças e ao ver-se assim, sozinho no mundo. Cada resposta o confundia, em se tratando de tão grandes lapsos de tempo e de assuntos que ele não conseguia entender. Não tinha coragem de perguntar por outros amigos, mas gritou desesperado: “Ninguém aqui conhece Rip Van Winkle?”
“Oh, Rip Van Winkle!”, exclamaram dois ou três, “Oh, claro!
Aquele ali, encostado na árvore, é Rip Van Winkle”.
Rip olhou e avistou uma réplica exata de si mesmo no tempo em que ele subiu a montanha. O pobre coitado estava agora completamente confuso. Duvidava de sua própria identidade, sem
saber se era ele mesmo ou um outro qualquer. Em meio a esse embaraço, perguntaram-lhe quem ele era e qual era seu nome.
“Só Deus sabe”, exclamou.” Não sou eu mesmo... sou uma outra pessoa...aquele ali é que sou eu...não... alguém tomou o meu lugar... Eu era eu mesmo a noite passada, mas adormeci na montanha e mudaram minha espingarda e tudo mudou, e eu mudei, e não sei dizer qual o meu nome ou quem sou eu!”
“Só Deus sabe”, exclamou.” Não sou eu mesmo... sou uma outra pessoa...aquele ali é que sou eu...não... alguém tomou o meu lugar... Eu era eu mesmo a noite passada, mas adormeci na montanha e mudaram minha espingarda e tudo mudou, e eu mudei, e não sei dizer qual o meu nome ou quem sou eu!”
Os que estavam presentes começaram então a olhar um para o outro, balançavam a cabeça, piscavam os olhos e passavam o dedo pela testa para dar a entender que o homem estava doido. Nesse momento, uma bela mulher abriu caminho na multidão para dar
uma olhada no velho de barba grisalha. Trazia nos braços uma criança gorducha, que, assustada com o olhar de Rip, começou a chorar. “Quieto, Rip”, gritou ela, “quieto, seu bobinho; o velho não vai machucar você”. O nome da criança, a aparência da mãe, o tom
de sua voz, tudo despertava um monte de recordações na mente de Rip. “Qual é o seu nome, minha boa mulher?”, perguntou.
“Judith Gardiner”.
“E o nome do seu pai?”
“Ah, pobre homem, Rip Van Winkle era seu nome, mas faz vinte anos que ele saiu de casa com sua espingarda e nunca mais se ouviu falar dele... Seu cachorro voltou para casa sozinho, mas se ele se matou ou se os índios o raptaram, ninguém pode dizer. Na
época, eu era uma garotinha”.
Rip só tinha mais uma pergunta a fazer, mas a fez com a voz tremendo:
“Onde está sua mãe?”
“Oh, ela também morreu, mas há pouco tempo; rebentou um vaso sangüíneo num acesso de cólera contra um vendedor ambulante”.
Havia naquilo uma ponta de consolo. Não pôde se conter mais. Abraçou sua filha e o filho dela. “Sou seu pai!”, gritou.
“Jovem Rip Van Winkle, em outros tempos...velho Rip Van
Winkle, agora!...Ninguém reconhece o pobre Rip Van Winkle?”
Todos ficaram admirados, até que uma velha, destacando-se da multidão, colocou sua mão na sobrancelha e, olhando atentamente para o rosto de Rip por um momento, exclamou: “Não
resta dúvida! É Rip Van Winkle... é ele mesmo! Bem-vindo em sua volta para casa, velho vizinho. Mas onde você esteve nesses vinte longos anos?”
A história de Rip foi narrada brevemente, pois os vinte anos tinham sido para ele apenas uma única noite. Os vizinhos ficaram espantados ao ouvi-la. Viram-se alguns piscarem o olho e fazer sinal de que achavam o homem louco.
Decidiu-se, porém, ouvir a opinião do velho Peter Vanderdonk. Era o mais antigo morador da aldeia e conhecedor de todos os acontecimentos extraordinários da redondeza. Reconheceu
Rip imediatamente e confirmou sua história da maneira mais satisfatória. Assegurou ao grupo que era fato estabelecido que as montanhas Kaatskill eram freqüentadas por seres estranhos. Seu pai os tinha visto uma vez, em seus antigos trajes holandeses, jogando bola numa cavidade da montanha. Ele próprio havia ouvido, numa tarde de verão, o som de suas bolas, como barulho remoto de trovão.
Para encurtar a história, o grupo se desfez e voltou a cuidar de algo mais importante, a eleição. A filha de Rip o levou para morar em sua casa confortável e bem mobiliada junto com ela e o marido.
Rip lembrou que ele era um dos meninos que costumavam trepar às suas costas. Quanto ao filho e herdeiro de Rip, que era a sua imagem, trabalhava na fazenda, mas revelava uma tendência hereditária a só fazer o que lhe interessava.
Rip agora retomava seus velhos hábitos. Encontrou muitos de seus antigos companheiros, mas todos tinham sofrido os estragos da passagem do tempo. Preferia fazer amigos entre a nova geração, entre a qual se tornou logo muito popular.
Sem nada para fazer em casa e tendo chegado àquela idade feliz em que um homem pode ser preguiçoso impunemente, tomou lugar mais uma vez no banco junto à porta da pousada e era reverenciado como um dos patriarcas da aldeia. Levou tempo para conseguir conversar normalmente ou compreender os estranhos acontecimentos que tinham ocorrido durante seu sono. Tinha havido uma guerra revolucionária, o país se libertara da Inglaterra e agora ele era um cidadão livre dos Estados Unidos. Na verdade, Rip não se interessava por política; as mudanças de estados e impérios pouco o impressionavam; mas havia uma espécie de tirania sob a qual ele sofrera muito tempo, a feminina. Felizmente chegara ao fim; livrara o pescoço do jugo do matrimônio e podia entrar e sair quando lhe desse na telha, sem temer a tirania da Senhora Van Rinkle. Sempre que seu nome era mencionado, porém, ele sacudia a cabeça, encolhia os ombros e erguia os olhos, o que podia passar por uma expressão de designação para com seu destino ou alegria por sua liberdade.
Rip costumava contar sua história a todo estrangeiro que chegava ao hotel do Senhor.Doolittle. Viam-no, de início, alterar certos detalhes cada vez que a contava, o que se devia, sem dúvida, ao fato de ter despertado há tão pouco tempo. Mas, finalmente, a narrativa fixou-se exatamente nos moldes em que a narrei, e nenhum homem, mulher ou criança da redondeza deixava de a saber de cor. Alguns sempre duvidavam de sua veracidade e insistiam em que Rip tinha perdido o juízo. Os velhos habitantes holandeses, porém, acreditavam, quase todos, nela. Ainda nos dias de hoje, jamais ouvem uma trovoada numa tarde de verão sobre o Kaatskill sem dizer que aquele grupo de homens estranhos estão jogando bola. E é um desejo comum a todos os maridos tiranizados pela esposa, na redondeza, quando a vida se torna um fardo, poderem beber um gole repousante do garrafão de Rip Van Winkle.
Apresentação de Arthur Conan Doyle
A SOCIEDADE DOS RUIVOS
Arthur Conan Doyle
Adaptação de Rogério Hafez
[I]
No ano passado, num dia do outono, fui visitar meu amigo, o famoso detetive Sherlock Holmes. Encontrei-o na companhia de um cavalheiro gordo, de meia-idade e cabelos da cor de um vermelho muito brilhante, com quem ele conversavaseriamente.
“Desculpe-me, Holmes”, eu lhe disse, constrangido pelaminha intrusão na conversa, “eu não sabia que você...”
“Ora, Watson, entre aqui”, disse-me Holmes, oferecendo-melogo uma cadeira para lhes fazer companhia. “Você não nos incomoda. Pelo contrário, está chegando num ótimo momento.”
“Tenho receio de que você esteja ocupado agora.”
“Não se preocupe”, disse Holmes. E acrescentou, virando-separa aquele obeso cavalheiro: “Sr. Wilson, este homem tem sidomeu companheiro e assistente em muitos dos casos que puderesolver com sucesso. Não há qualquer dúvida de que ele tambémpoderá ajudar-nos em seu caso.”
Com certa dificuldade, aquele homem obeso levantou-se desua cadeira e olhou para mim com muito cuidado, como se me examinasse.
“Sr. Wilson, o senhor se importaria em contar a sua história novamente, desde o início?”, perguntou Holmes. “Parece-me que a sua história é na verdade um caso bastante singular, diferente de todos os outros que já pude conhecer em minha longa experiência, e eu desejo que o Dr. Watson ouça comigo todos os detalhes dela. No momento, eu ainda não saberia dizer ao senhor se há ou não em sua história algum sinal ou prova de um crime cometido.”
O cavalheiro respirou profundamente, com um certo orgulho. Retirou então, de seu bolso, um velho jornal. Enquanto ele procurava, com cuidado, algo na lista de anúncios que estavam
numa das colunas do jornal, eu aproveitei esse tempo para observálo. Porém, o exame que eu dele fazia não me permitia concluir muitas coisas, pois o seu aspecto nada tinha de extraordinário e ele se parecia, afinal, com qualquer outro homem da classe média inglesa. A única coisa incomum, nele, era o seu cabelo ruivo, de
um vermelho que parecia realmente brilhar. Tenho certeza de que meu amigo Holmes, por sua vez, com o grande poder de observação que possuía, já poderia nesse momento descrever toda a história da vida e da experiência daquele homem, apenas olhando para as suas roupas, as suas maneiras de se comportar, e os muitos detalhes que compunham o conjunto de sua aparência.
Holmes percebeu que eu examinava o Sr. Wilson, e sorriu-me discretamente. “Ah, já o encontrei. Aqui está o anúncio que eu procurava”, disse finalmente o Sr. Wilson. “Toda a história começa com este anúncio. Acho que o senhor pode lê-lo sozinho,
“Sr. Wilson, o senhor se importaria em contar a sua história novamente, desde o início?”, perguntou Holmes. “Parece-me que a sua história é na verdade um caso bastante singular, diferente de todos os outros que já pude conhecer em minha longa experiência, e eu desejo que o Dr. Watson ouça comigo todos os detalhes dela. No momento, eu ainda não saberia dizer ao senhor se há ou não em sua história algum sinal ou prova de um crime cometido.”
O cavalheiro respirou profundamente, com um certo orgulho. Retirou então, de seu bolso, um velho jornal. Enquanto ele procurava, com cuidado, algo na lista de anúncios que estavam
numa das colunas do jornal, eu aproveitei esse tempo para observálo. Porém, o exame que eu dele fazia não me permitia concluir muitas coisas, pois o seu aspecto nada tinha de extraordinário e ele se parecia, afinal, com qualquer outro homem da classe média inglesa. A única coisa incomum, nele, era o seu cabelo ruivo, de
um vermelho que parecia realmente brilhar. Tenho certeza de que meu amigo Holmes, por sua vez, com o grande poder de observação que possuía, já poderia nesse momento descrever toda a história da vida e da experiência daquele homem, apenas olhando para as suas roupas, as suas maneiras de se comportar, e os muitos detalhes que compunham o conjunto de sua aparência.
Holmes percebeu que eu examinava o Sr. Wilson, e sorriu-me discretamente. “Ah, já o encontrei. Aqui está o anúncio que eu procurava”, disse finalmente o Sr. Wilson. “Toda a história começa com este anúncio. Acho que o senhor pode lê-lo sozinho,
Sr. Watson."
Então, eu peguei de suas mãos o jornal, e li o seguinte:
Sociedade dos Ruivos — Uma outra posição se abre para o
ingresso na Sociedade dos Ruivos. A Sociedade foi fundada há
alguns anos com o dinheiro deixado para esse fim pelo Sr. E.
Hopkins, do Estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos da
América. Os membros da Sociedade recebem um salário de 4
pounds3 por semana. O trabalho que têm na instituição é muito
pouco e não os impede de trabalhar em outro local. Podem
candidatar-se à posição de membro da Sociedade todos os homens
ruivos de Londres que tenham mais de vinte e um anos de idade.
Para se candidatarem, devem procurar o Sr. Duncan Ross nos
escritórios da Sociedade dos Ruivos, que se encontram na Rua
Fleet, número 7. O Sr. Duncan Ross estará recebendo os
candidatos apenas na próxima segunda-feira, às onze horas da
manhã.
ingresso na Sociedade dos Ruivos. A Sociedade foi fundada há
alguns anos com o dinheiro deixado para esse fim pelo Sr. E.
Hopkins, do Estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos da
América. Os membros da Sociedade recebem um salário de 4
pounds3 por semana. O trabalho que têm na instituição é muito
pouco e não os impede de trabalhar em outro local. Podem
candidatar-se à posição de membro da Sociedade todos os homens
ruivos de Londres que tenham mais de vinte e um anos de idade.
Para se candidatarem, devem procurar o Sr. Duncan Ross nos
escritórios da Sociedade dos Ruivos, que se encontram na Rua
Fleet, número 7. O Sr. Duncan Ross estará recebendo os
candidatos apenas na próxima segunda-feira, às onze horas da
manhã.
Holmes sorriu novamente. Perguntou-me então, com o humor que habitualmente demonstrava quando começava a investigar um caso novo e interessante: “Parece bastante incomum, não?” E, voltando-se para o cavalheiro: “Sr. Wilson, conte-nos um pouco de sua vida pessoal e do impacto que teve sobre ela este anúncio que o senhor nos mostrou. Você deve ter notado a data do jornal, não é mesmo, Watson? Este anúncio foi publicado há exatamente dois meses.”
[II]
tivesse de pagar todo o seu salário, não poderia hoje tê-lo a meu lado como um empregado.”
“Diga-me, Sr. Wilson: como se chama esse jovem ajudante que, tão gentilmente, aceitou trabalhar para o senhor recebendo apenas a metade do salário?”, perguntou Holmes.
“Ele se chama Vincent Spaulding, e na verdade não é tão jovem como o senhor deve ter suposto. Ele não é um aprendiz nessa profissão e não sei, na realidade, qual é a idade que tem, mas é muito competente e trabalha de modo inteiramente satisfatório. Imagine o senhor que freqüentemente me pergunto por que
razão ele não me deixa e não procura uma colocação mais adequada às suas capacidades. Ele encontraria facilmente outro lugar em que poderia trabalhar, tenho certeza disso. Mas na verdade sou grato a ele e estou muito feliz com seu trabalho.”
“Sim, de fato, tudo isso é bastante estranho”, disse Holmes. “Talvez tão estranho quanto esse anúncio que o senhor nos mostrou.” “Mas veja bem, acho que ele também tem os seus defeitos”, retomou Wilson. “Por exemplo: ele se interessa demasiadamente, a meu ver, pela técnica da fotografia. Nunca conheci ninguém assim. Ele gasta um tempo enorme, de fato, tirando as suas fotografias, em vez de se dedicar aos estudos ou trabalhar ainda mais. E depois ele é obrigado a descer ao nosso porão, onde permanece durante horas revelando os seus negativos.”
“Ele ainda continua trabalhando com o senhor, eu suponho”, disse Holmes.
“Ah, sim”, disse Wilson. “E foi ele também que, por coincidência, chamou a minha atenção para este anúncio da Sociedade dos Ruivos. Lembro-me muito bem: ele chegou um dia à loja com este mesmo jornal em suas mãos, dizendo-me:
‘Ah, Sr. Wilson, o senhor é que é um afortunado! Como eu gostaria de ser um homem ruivo!’”
“Por quê?”, eu lhe perguntei.
“Veja este anúncio: há uma nova vaga na Sociedade dos Ruivos. Parece, pelo que dizem, que o homem que consegue ser admitido nessa Sociedade acaba recebendo uma fortuna em dinheiro. Dizem que o salário é muito bom e que não é preciso trabalhar muito para fazer jus a ele. Eu dou a minha palavra ao senhor e lhe garanto que eu não acharia nada mal se, nesse instante, o meu cabelo mudasse repentinamente de cor e se tornasse ruivo.”
“‘Mas... diga-me, de que tipo de trabalho se trata afinal?’, perguntei. ‘O senhor há de compreender essa minha curiosidade e a minha precária situação, Sr. Holmes: sou um homem muito caseiro e solitário, sei muito pouco do que acontece pelo mundo afora. Não tenho o costume de ler os jornais e, mesmo à noite, tenho o hábito de permanecer em casa. Não gosto de sair de casa.’”
“Não me diga que o senhor nunca ouviu falar da Sociedade dos Ruivos...”, foi o que me perguntou nesse dia, com os olhos arregalados, o meu ajudante, Vincent Spaulding.
E lhe respondi: “Não, nunca.”
“Isso é muito curioso, ainda mais sendo o senhor um homem ruivo. Mas isso não tem importância, acho que o senhor talvez possa obter uma posição nessa Sociedade de todo modo”, ele disse.
“E será que vale a pena? O que é que vou ganhar com isso?”, perguntei.
“Bem, sendo admitido na Sociedade, o senhor ganhará cerca de duzentos pounds por ano. Acho que é muito dinheiro, sobretudo se o senhor pensar que o trabalho é bastante leve. Ele não exige quase nada dos membros da Sociedade, e parece que é possível conjugá-lo, ao mesmo tempo, com o trabalho que se tem normalmente em outro lugar.”
“Vincent, diga-me tudo o que você sabe sobre esse trabalho”, eu lhe disse, pois estava ficando, naturalmente, bastante interessado nessa possibilidade de vir a ganhar algum dinheiro extra, ainda mais diante das dificuldades que eu venho enfrentando, como já expliquei aos senhores.
“Bem, o senhor pode ler com os seus próprios olhos, basta ver este anúncio. A Sociedade dos Ruivos dispõe de uma vaga no momento, e aqui está o endereço para os candidatos se apresentarem. Toda a informação necessária está dada no anúncio: se eu o entendo bem, a Sociedade foi fundada por um estranho
milionário americano, o Sr. E. Hopkins, cujas maneiras eram de fato excêntricas e cujos cabelos eram, também, ruivos. Ele sempre teve uma enorme simpatia por todos os homens ruivos que conheceu na vida. Quando ele morreu, descobriu-se que ele havia deixado, em seu testamento, instruções e uma imensa fortuna para que se formasse a Sociedade dos Ruivos, que desse oportunidades de trabalho para homens ruivos. Ele desejava, como disse em seu testamento, que se oferecesse aos ruivos sempre um trabalho simples e muito bem pago.”
E lhe respondi: “Não, nunca.”
“Isso é muito curioso, ainda mais sendo o senhor um homem ruivo. Mas isso não tem importância, acho que o senhor talvez possa obter uma posição nessa Sociedade de todo modo”, ele disse.
“E será que vale a pena? O que é que vou ganhar com isso?”, perguntei.
“Bem, sendo admitido na Sociedade, o senhor ganhará cerca de duzentos pounds por ano. Acho que é muito dinheiro, sobretudo se o senhor pensar que o trabalho é bastante leve. Ele não exige quase nada dos membros da Sociedade, e parece que é possível conjugá-lo, ao mesmo tempo, com o trabalho que se tem normalmente em outro lugar.”
“Vincent, diga-me tudo o que você sabe sobre esse trabalho”, eu lhe disse, pois estava ficando, naturalmente, bastante interessado nessa possibilidade de vir a ganhar algum dinheiro extra, ainda mais diante das dificuldades que eu venho enfrentando, como já expliquei aos senhores.
“Bem, o senhor pode ler com os seus próprios olhos, basta ver este anúncio. A Sociedade dos Ruivos dispõe de uma vaga no momento, e aqui está o endereço para os candidatos se apresentarem. Toda a informação necessária está dada no anúncio: se eu o entendo bem, a Sociedade foi fundada por um estranho
milionário americano, o Sr. E. Hopkins, cujas maneiras eram de fato excêntricas e cujos cabelos eram, também, ruivos. Ele sempre teve uma enorme simpatia por todos os homens ruivos que conheceu na vida. Quando ele morreu, descobriu-se que ele havia deixado, em seu testamento, instruções e uma imensa fortuna para que se formasse a Sociedade dos Ruivos, que desse oportunidades de trabalho para homens ruivos. Ele desejava, como disse em seu testamento, que se oferecesse aos ruivos sempre um trabalho simples e muito bem pago.”
[III]
“‘Na verdade, não se trata de todo o conjunto dos homens ruivos’, explicou-me Vincent. ‘O Sr. Hopkins desejou que a Sociedade se limitasse aos ruivos da cidade de Londres, e que só ingressassem nela homens adultos. Isto porque esse milionário americano era nascido em Londres, e desejava fazer algo de bom à sua cidade natal, que ele muito amava. Além disso, há um detalhe importante: ouvi falar que um dos requisitos principais para o ingresso na Sociedade é o de que a cor dos cabelos não seja apenas ligeiramente ruiva, ou tampouco demasiadamente ruiva. É preciso que eles sejam ruivos exatamente como os do senhor, isto é, de
uma cor ruiva inconfundível e brilhante. É por essa razão que eu tenho certeza, Sr. Wilson, de que o senhor poderia facilmente ingressar na Sociedade dos Ruivos — supondo, é claro, que o senhor se interesse por isso.’”
“Bem, cavalheiros, é de fato inegável que eu tenho os cabelos ruivos, e foi por isso que eu imaginei que seria capaz de ingressar na Sociedade do Sr. Hopkins e ganhar esse dinheiro extra de que tanto necessitava. Como meu ajudante Vincent parecia estar bastante informado acerca da Sociedade, pedi-lhe que me acompanhasse, na segunda-feira seguinte, até o endereço indicado no anúncio. Pois bem, Sr. Holmes, saiba o senhor que fomos àquele local no dia marcado, e que eu fiquei muito impressionado com o que então pude ver. Tive a impressão de que todos os londrinos que possuíam os cabelos ligeiramente arruivados haviam comparecido à Rua Fleet, com a intenção de obter aquele emprego. A rua estava inteiramente tomada por uma enorme multidão, e havia ainda uma fila de pessoas à espera, que se arrastava por todo um quarteirão. Quando vi todos aqueles homens ali reunidos, tive vontade de desistir imediatamente daquela idéia de ingressar na Sociedade e quis voltar para casa. Vincent, porém, insistiu em que eu permanecesse, encorajando-me muito ao fazer uma observação: eu era um dos poucos homens que, em meio àquela multidão, possuíam os cabelos realmente ruivos e brilhantes. Por fim, muito convicto, ele mesmo tomou a iniciativa de abrir caminho em meio à multidão, mesmo recorrendo aos empurrões e às cotoveladas , até que conseguimos chegar aos pés da escada que dava acesso ao escritório da Sociedade. A visão que tive então também era bastante desoladora. Havia ali apenas duas fileiras de homens: uma dos que entravam esperançosos no escritório, e outra dos que dele saíam, com um ar de desespero.”
uma cor ruiva inconfundível e brilhante. É por essa razão que eu tenho certeza, Sr. Wilson, de que o senhor poderia facilmente ingressar na Sociedade dos Ruivos — supondo, é claro, que o senhor se interesse por isso.’”
“Bem, cavalheiros, é de fato inegável que eu tenho os cabelos ruivos, e foi por isso que eu imaginei que seria capaz de ingressar na Sociedade do Sr. Hopkins e ganhar esse dinheiro extra de que tanto necessitava. Como meu ajudante Vincent parecia estar bastante informado acerca da Sociedade, pedi-lhe que me acompanhasse, na segunda-feira seguinte, até o endereço indicado no anúncio. Pois bem, Sr. Holmes, saiba o senhor que fomos àquele local no dia marcado, e que eu fiquei muito impressionado com o que então pude ver. Tive a impressão de que todos os londrinos que possuíam os cabelos ligeiramente arruivados haviam comparecido à Rua Fleet, com a intenção de obter aquele emprego. A rua estava inteiramente tomada por uma enorme multidão, e havia ainda uma fila de pessoas à espera, que se arrastava por todo um quarteirão. Quando vi todos aqueles homens ali reunidos, tive vontade de desistir imediatamente daquela idéia de ingressar na Sociedade e quis voltar para casa. Vincent, porém, insistiu em que eu permanecesse, encorajando-me muito ao fazer uma observação: eu era um dos poucos homens que, em meio àquela multidão, possuíam os cabelos realmente ruivos e brilhantes. Por fim, muito convicto, ele mesmo tomou a iniciativa de abrir caminho em meio à multidão, mesmo recorrendo aos empurrões e às cotoveladas , até que conseguimos chegar aos pés da escada que dava acesso ao escritório da Sociedade. A visão que tive então também era bastante desoladora. Havia ali apenas duas fileiras de homens: uma dos que entravam esperançosos no escritório, e outra dos que dele saíam, com um ar de desespero.”
“De fato isso é muito, muito interessante”, disse Holmes.
“Queira continuar, por favor, Sr. Wilson.”
“No interior do escritório, não havia nada senão algumas poucas cadeiras e uma mesa. Atrás dela, estava sentado um homem de cabelos ruivos, ainda mais brilhantes do que os meus. Ele sempre dizia algumas palavras gentis a cada homem que se apresentava, mas era depois muito exigente: logo descobria um defeito no candidato e já o dispensava. Percebi então que obter aquela posição não era, afinal, algo simples como podia parecer. Porém, quando chegou a minha vez, aquele homem deu a impressão de ter ficado muito interessado; ele fechou a porta atrás de mim, de modo que pudéssemos conversar com maior privacidade.”
“‘Eu tomo a liberdade de apresentá-lo ao Sr. Wilson’, disse Vincent Spaulding, que havia permanecido comigo; ‘ele gostaria de ocupar a vaga que está sendo oferecida na Sociedade dos Ruivos.’”
“‘Muito bem, parece que os cabelos dele têm, de fato, a cor certa’, ele respondeu. ‘Confesso que estou muito impressionado: não me recordo de ter visto, jamais, cabelos ruivos de uma cor tão perfeita.’ E então ele recuou um pouco, afastando-se um passo e examinando-me com toda a atenção durante mais de um minuto. Depois disso, estendeu-me a mão e cumprimentou-me efusivamente.”
“Queira continuar, por favor, Sr. Wilson.”
“No interior do escritório, não havia nada senão algumas poucas cadeiras e uma mesa. Atrás dela, estava sentado um homem de cabelos ruivos, ainda mais brilhantes do que os meus. Ele sempre dizia algumas palavras gentis a cada homem que se apresentava, mas era depois muito exigente: logo descobria um defeito no candidato e já o dispensava. Percebi então que obter aquela posição não era, afinal, algo simples como podia parecer. Porém, quando chegou a minha vez, aquele homem deu a impressão de ter ficado muito interessado; ele fechou a porta atrás de mim, de modo que pudéssemos conversar com maior privacidade.”
“‘Eu tomo a liberdade de apresentá-lo ao Sr. Wilson’, disse Vincent Spaulding, que havia permanecido comigo; ‘ele gostaria de ocupar a vaga que está sendo oferecida na Sociedade dos Ruivos.’”
“‘Muito bem, parece que os cabelos dele têm, de fato, a cor certa’, ele respondeu. ‘Confesso que estou muito impressionado: não me recordo de ter visto, jamais, cabelos ruivos de uma cor tão perfeita.’ E então ele recuou um pouco, afastando-se um passo e examinando-me com toda a atenção durante mais de um minuto. Depois disso, estendeu-me a mão e cumprimentou-me efusivamente.”
“‘O senhor vai me desculpar’, ele prosseguiu, ‘mas tenho ainda de tomar uma precaução’. E então, de repente, ele agarrou os meus cabelos com suas duas mãos e começou a puxá-los; ele os puxou tanto e tanto que, ao final, eu gritei de dor. ‘Estou vendoque há verdadeiras lágrimas nos seus olhos’, ele disse quando os
soltou. ‘Já basta, está tudo muito bem. O senhor sabe, nós temos de ser muito cuidadosos na seleção dos candidatos, pois já nos enganaram algumas vezes por meio de cabelos artificiais ou mesmo com tingimentos.’ Ele foi então até a janela e gritou à multidão, que ainda aguardava na rua, que a vaga já havia sido preenchida. Houve então muitos gritos de desapontamento, mas logo depois os homens se retiraram, um por um, até que as únicas cabeças ruivas que permaneciam à vista fossem a do gerente do escritório e a minha própria.”
soltou. ‘Já basta, está tudo muito bem. O senhor sabe, nós temos de ser muito cuidadosos na seleção dos candidatos, pois já nos enganaram algumas vezes por meio de cabelos artificiais ou mesmo com tingimentos.’ Ele foi então até a janela e gritou à multidão, que ainda aguardava na rua, que a vaga já havia sido preenchida. Houve então muitos gritos de desapontamento, mas logo depois os homens se retiraram, um por um, até que as únicas cabeças ruivas que permaneciam à vista fossem a do gerente do escritório e a minha própria.”
[IV]
“Ele perguntou-me se eu era casado e, quando respondi que era solteiro, ele disse com uma voz grave e triste:
“Sinto muito ouvir o senhor falar uma coisa dessas. A Sociedade realmente dá preferência a homens casados, pois ela tem outro importante objetivo, o de que seus membros tenham filhos ruivos. Mas... quem sabe... talvez eles possam aceitá-lo mesmo assim.”
“Esclareci a ele também que eu já possuía uma atividade em minha casa de penhores e que estaria sempre ocupado durante uma parte do dia, mas Vincent Spaulding me interrompeu então, dizendo que teria muito prazer em me substituir na loja, para que eu pudesse aceitar todo o período de trabalho na Sociedade.”
“Qual será o horário de trabalho?”, perguntei.
“Das dez da manhã às duas da tarde, todos os dias.”
“Bem, uma vez que o meu trabalho na loja é feito principalmente à tarde, e já que eu tinha muita confiança em Vincent Spaulding, sabendo que ele poderia facilmente desempenhar a minha função durante a minha ausência, aquela proposta do Sr. Ross pareceu-me muito conveniente e satisfatória.”
“Isso se adapta perfeitamente à minha situação”, eu lhe disse. “E qual será o pagamento?”
“Quatro pounds por semana.”
“E qual é o trabalho que deverei fazer?”
“‘O trabalho é realmente muito simples’, respondeu. ‘O senhor terá de estar neste escritório das dez horas da manhã às duas horas da tarde, como lhe disse, todos os dias. Se o senhor sair do escritório durante esse período, perderá imediatamente, de modo definitivo, sua posição na Sociedade. Durante o seu tempo de trabalho, o senhor terá simplesmente de copiar páginas da Enciclopédia Britânica. O senhor vai começar pelo primeiro volume, o da letra “A”, e deve trazer consigo sua própria canetatinteiro, mais papel e tinta. O senhor acha que estaria pronto para já começar amanhã mesmo?’”
“Sim, com certeza”, respondi.
“Então está tudo acertado. Até breve, Sr. Wilson. Permita-lhe dizer apenas que o considero um homem muito afortunado, por ter sido admitido na Sociedade dos Ruivos.” Então fizemos um aperto de mãos, e fui para casa, na companhia de meu ajudante, sentindome muito bem e muito feliz com a minha própria sorte.
“Ao entardecer, porém, quando me pus a refletir sobre tudo o que ocorrera, eu já não estava tão contente assim. Parecia-me na verdade ridículo que alguém se dispusesse a me pagar aquele salário de 4 pounds por semana — que era, afinal, uma quantia de dinheiro considerável — simplesmente em troca da minha presença num escritório, quatro horas por dia, a fim de que eu copiasse verbetes da Enciclopédia Britânica. Eu achei que alguém deveria estar tentando, com isso, pregar-me uma peça, ou fazer-me de bobo, os senhores entendem?”
“Quatro pounds por semana.”
“E qual é o trabalho que deverei fazer?”
“‘O trabalho é realmente muito simples’, respondeu. ‘O senhor terá de estar neste escritório das dez horas da manhã às duas horas da tarde, como lhe disse, todos os dias. Se o senhor sair do escritório durante esse período, perderá imediatamente, de modo definitivo, sua posição na Sociedade. Durante o seu tempo de trabalho, o senhor terá simplesmente de copiar páginas da Enciclopédia Britânica. O senhor vai começar pelo primeiro volume, o da letra “A”, e deve trazer consigo sua própria canetatinteiro, mais papel e tinta. O senhor acha que estaria pronto para já começar amanhã mesmo?’”
“Sim, com certeza”, respondi.
“Então está tudo acertado. Até breve, Sr. Wilson. Permita-lhe dizer apenas que o considero um homem muito afortunado, por ter sido admitido na Sociedade dos Ruivos.” Então fizemos um aperto de mãos, e fui para casa, na companhia de meu ajudante, sentindome muito bem e muito feliz com a minha própria sorte.
“Ao entardecer, porém, quando me pus a refletir sobre tudo o que ocorrera, eu já não estava tão contente assim. Parecia-me na verdade ridículo que alguém se dispusesse a me pagar aquele salário de 4 pounds por semana — que era, afinal, uma quantia de dinheiro considerável — simplesmente em troca da minha presença num escritório, quatro horas por dia, a fim de que eu copiasse verbetes da Enciclopédia Britânica. Eu achei que alguém deveria estar tentando, com isso, pregar-me uma peça, ou fazer-me de bobo, os senhores entendem?”
“Sim, entendemos sua preocupação”, disse eu imediatamente.
“Entretanto Vincent Spaulding, meu assistente, disse-me que tinha certeza de que tudo estava bem, e de que não havia nada com que eu deveria me preocupar. Suas impressões me tranquilizaram bastante, de modo que, no dia seguinte, resolvi experimentar aquele trabalho, ainda que não estivesse certo de dever aceitá-lo.
Comprei tinta, papel, uma nova caneta, e dirigi-me ao escritório da Rua Fleet.”
“Bem, devo dizer aos senhores que, para a minha grande surpresa, tudo transcorreu de uma maneira correta e muito satisfatória. A mesa do escritório já estava pronta para o meu trabalho, e o Sr. Duncan Ross estava lá à minha espera. Ele deu-me o volume da Enciclopédia Britânica com letra ‘A’ para começar a copiar e, de tempos em tempos, vinha dar uma olhada em meu trabalho para ver como é que eu estava me saindo. Às duas horas da tarde, em ponto, ele veio despedir-se de mim, dizendo que meu expediente6 estava encerrado naquele dia e que ele estava muito contente com o meu primeiro dia de trabalho.”
“O mesmo ocorreu nos dias seguintes. No sábado, o Sr. Ross veio até mim e pagou-me integralmente o salário de 4 pounds referente àquela semana. Fiquei, então, naturalmente muito feliz com o andamento de todas as coisas. À medida que o tempo prosseguia, o Sr. Ross vinha me ver com uma freqüência cada vez menor, até que, por fim, ele só raramente aparecia no escritório, a não ser aos sábados, quando vinha pagar-me, coisa que jamais deixou de fazer, e com toda a pontualidade. Assim sendo, eu nunca pensei em deixar o escritório sequer um momento durante o meu expediente, pois tinha, naturalmente, muito medo de perder aquela excelente posição que havia conquistado na Sociedade dos Ruivos.”
“Entretanto Vincent Spaulding, meu assistente, disse-me que tinha certeza de que tudo estava bem, e de que não havia nada com que eu deveria me preocupar. Suas impressões me tranquilizaram bastante, de modo que, no dia seguinte, resolvi experimentar aquele trabalho, ainda que não estivesse certo de dever aceitá-lo.
Comprei tinta, papel, uma nova caneta, e dirigi-me ao escritório da Rua Fleet.”
“Bem, devo dizer aos senhores que, para a minha grande surpresa, tudo transcorreu de uma maneira correta e muito satisfatória. A mesa do escritório já estava pronta para o meu trabalho, e o Sr. Duncan Ross estava lá à minha espera. Ele deu-me o volume da Enciclopédia Britânica com letra ‘A’ para começar a copiar e, de tempos em tempos, vinha dar uma olhada em meu trabalho para ver como é que eu estava me saindo. Às duas horas da tarde, em ponto, ele veio despedir-se de mim, dizendo que meu expediente6 estava encerrado naquele dia e que ele estava muito contente com o meu primeiro dia de trabalho.”
“O mesmo ocorreu nos dias seguintes. No sábado, o Sr. Ross veio até mim e pagou-me integralmente o salário de 4 pounds referente àquela semana. Fiquei, então, naturalmente muito feliz com o andamento de todas as coisas. À medida que o tempo prosseguia, o Sr. Ross vinha me ver com uma freqüência cada vez menor, até que, por fim, ele só raramente aparecia no escritório, a não ser aos sábados, quando vinha pagar-me, coisa que jamais deixou de fazer, e com toda a pontualidade. Assim sendo, eu nunca pensei em deixar o escritório sequer um momento durante o meu expediente, pois tinha, naturalmente, muito medo de perder aquela excelente posição que havia conquistado na Sociedade dos Ruivos.”
[V]
“Como assim? Acabou?”
“Sim senhor, acabou! Uma manhã eu fui para o trabalho, como já havia me habituado, às dez horas, mas a porta do escritório estava trancada. Nada havia no local, a não ser um pequeno cartaz colado à porta. Aqui está também o cartaz, eu o trouxe para que vocês pudessem lê-lo com os próprios olhos.”
Ele nos ergueu um pedaço de papel branco, no qual se lia o seguinte:
A Sociedade dos Ruivos foi extinta.
9 de outubro de 1890
“‘Eu não vejo nada muito engraçado nisso tudo’, disse o Sr. Wilson, irritando-se ligeiramente com as nossas risadas. ‘Se os senhores nada podem fazer nesse caso, a não ser rir de mim, eu posso perfeitamente procurar outro detetive.’”
‘“Não, não, de modo algum’, interveio Holmes, desculpandose. ‘Estou de fato interessadíssimo pelo seu caso. Ele é absolutamente incomum, asseguro-lhe. Mas ele também tem, igualmente, o senhor há de convir, um lado humorístico. Mas conte-me, quais foram as ações que o senhor tomou a seguir?’”
“No início, para ser franco, eu não sabia bem o que fazer. Eu fui a alguns dos outros escritórios que há no mesmo edifício do número 7 da Rua Fleet, mas em nenhum deles consegui nenhuma informação acerca do fechamento do escritório da Sociedade. Dirigi-me, então, ao proprietário do edifício: ele me disse que jamais tinha ouvido falar da tal Sociedade dos Ruivos. Pergunteilhe, então, quem era o Sr. Duncan Ross: ele me disse que esse nome era inteiramente desconhecido dele.” Resolvi fazer-lhe então a mesma questão de um outro modo:
“Refiro-me ao senhor que ocupava a sala de número 4 do edifício, e que aí possuía um escritório.”
“Ah, aquele senhor de cabelos ruivos?”
“Exatamente”, disse-lhe eu, já com certa impaciência.
“‘Oh, o seu nome era William Morris’, disse-me o proprietário, ‘ele era um advogado e estava servindo-se da sala de número 4 como um local temporário de trabalho, até que terminasse a construção de seu escritório.’”
“E onde é que eu posso encontrá-lo agora?”
“Oh, creio que no novo escritório que ele tem. Se não me engano, ele deu-me seu novo endereço. Sim, aqui está: Rua King, número 17.”
“Eu parti imediatamente para aquele local, mas quando cheguei ao número 17 da Rua King... tratava-se na verdade de um edifício de uma enorme fábrica, e ninguém sabia me dizer nada a respeito de um senhor chamado William Morris ou Duncan Ross.”
“O que foi que o senhor resolveu fazer, então?”, perguntou Holmes.
“Eu simplesmente fui para minha casa e conversei com meu ajudante, Sr. Vincent Spaulding, sobre todo o ocorrido. Ele tranqüilizou-me mais uma vez, dizendo-me que tinha certeza de que eu iria receber pelo menos um comunicado da Sociedade pelo correio. Disse-me, em resumo, que na sua opinião eu deveria esperar. E é o que tenho feito desde então; mas confesso que eu não gostaria de perder, neste ínterim, uma posição tão boa como essa que havia conquistado. Além disso, Sr. Holmes, decidi vir procurá-lo e consultá-lo porque ouvi falar que o senhor às vezes ajuda pessoas pobres a resolver os problemas que têm. Isso é tudo o que eu tinha a dizer ao senhor, creio eu.”
“O senhor foi muito sábio, e agiu muito bem”, disse Holmes. “Estou certo de que poderei ajudá-lo. O seu caso é extremamente incomum, e eu acho que talvez se trate de um assunto muito mais sério do que o senhor imagina.”
“‘Mas já é muito sério’, insistiu Wilson, ‘pois eu perdi um trabalho que me pagava muito bem.”’
‘“O senhor tem toda a razão’, disse Holmes gentilmente. ‘Agora, tenha a gentileza de me contar algumas coisas a respeito desse seu ajudante, Vincent Spaulding, pois estou muito intrigadocom ele. Quanto tempo fazia que ele já trabalhava para o senhor quando ele lhe trouxe este anúncio da Sociedade dos Ruivos?”’
“Cerca de um mês.”
“Como foi que ele se apresentou ao senhor?”
“Em resposta a um anúncio de emprego que eu fizera.”
“Ele foi o único candidato que se apresentou em resposta ao anúncio?”
“Não, havia cerca de uma dúzia de pessoas.”
“E por que o senhor o escolheu, preferindo-o aos demais?”
“Porque ele me pareceu muito capaz e porque se dispôs a trabalhar recebendo apenas a metade do salário usual para aquele emprego.”
“Como ele é fisicamente, Sr. Wilson, esse tal de Vincent Spaulding?”
“Ele tem baixa estatura, é muito ligeiro em seus movimentos e tem muito pouca barba em seu rosto, embora esteja, acho eu, com cerca de trinta anos de idade. Ele tem também uma mancha clara em sua fronte, produzida pela queda de um ácido sobre a sua pele.”
Nesse momento, Holmes endireitou-se em sua cadeira, demonstrando uma grande excitação. “Eu acho que conheço esse homem”, disse. “Ele não tem as orelhas furadas, a fim de poder usar brincos?”
“Sim, é verdade, ele tem.”
“Muito bem”, disse Holmes. “Ele ainda trabalha para o senhor?”
“Sim, e ele continua desempenhando as suas funções perfeitamente”, disse Wilson.
“Isso já é o bastante, Sr. Wilson”, disse Holmes. “Eu terei grande satisfação em dar um parecer ao senhor daqui a um ou dois dias — provavelmente na segunda-feira próxima. Despeço-me aqui do senhor. Até lá, e passe bem!”
“Oh, creio que no novo escritório que ele tem. Se não me engano, ele deu-me seu novo endereço. Sim, aqui está: Rua King, número 17.”
“Eu parti imediatamente para aquele local, mas quando cheguei ao número 17 da Rua King... tratava-se na verdade de um edifício de uma enorme fábrica, e ninguém sabia me dizer nada a respeito de um senhor chamado William Morris ou Duncan Ross.”
“O que foi que o senhor resolveu fazer, então?”, perguntou Holmes.
“Eu simplesmente fui para minha casa e conversei com meu ajudante, Sr. Vincent Spaulding, sobre todo o ocorrido. Ele tranqüilizou-me mais uma vez, dizendo-me que tinha certeza de que eu iria receber pelo menos um comunicado da Sociedade pelo correio. Disse-me, em resumo, que na sua opinião eu deveria esperar. E é o que tenho feito desde então; mas confesso que eu não gostaria de perder, neste ínterim, uma posição tão boa como essa que havia conquistado. Além disso, Sr. Holmes, decidi vir procurá-lo e consultá-lo porque ouvi falar que o senhor às vezes ajuda pessoas pobres a resolver os problemas que têm. Isso é tudo o que eu tinha a dizer ao senhor, creio eu.”
“O senhor foi muito sábio, e agiu muito bem”, disse Holmes. “Estou certo de que poderei ajudá-lo. O seu caso é extremamente incomum, e eu acho que talvez se trate de um assunto muito mais sério do que o senhor imagina.”
“‘Mas já é muito sério’, insistiu Wilson, ‘pois eu perdi um trabalho que me pagava muito bem.”’
‘“O senhor tem toda a razão’, disse Holmes gentilmente. ‘Agora, tenha a gentileza de me contar algumas coisas a respeito desse seu ajudante, Vincent Spaulding, pois estou muito intrigadocom ele. Quanto tempo fazia que ele já trabalhava para o senhor quando ele lhe trouxe este anúncio da Sociedade dos Ruivos?”’
“Cerca de um mês.”
“Como foi que ele se apresentou ao senhor?”
“Em resposta a um anúncio de emprego que eu fizera.”
“Ele foi o único candidato que se apresentou em resposta ao anúncio?”
“Não, havia cerca de uma dúzia de pessoas.”
“E por que o senhor o escolheu, preferindo-o aos demais?”
“Porque ele me pareceu muito capaz e porque se dispôs a trabalhar recebendo apenas a metade do salário usual para aquele emprego.”
“Como ele é fisicamente, Sr. Wilson, esse tal de Vincent Spaulding?”
“Ele tem baixa estatura, é muito ligeiro em seus movimentos e tem muito pouca barba em seu rosto, embora esteja, acho eu, com cerca de trinta anos de idade. Ele tem também uma mancha clara em sua fronte, produzida pela queda de um ácido sobre a sua pele.”
Nesse momento, Holmes endireitou-se em sua cadeira, demonstrando uma grande excitação. “Eu acho que conheço esse homem”, disse. “Ele não tem as orelhas furadas, a fim de poder usar brincos?”
“Sim, é verdade, ele tem.”
“Muito bem”, disse Holmes. “Ele ainda trabalha para o senhor?”
“Sim, e ele continua desempenhando as suas funções perfeitamente”, disse Wilson.
“Isso já é o bastante, Sr. Wilson”, disse Holmes. “Eu terei grande satisfação em dar um parecer ao senhor daqui a um ou dois dias — provavelmente na segunda-feira próxima. Despeço-me aqui do senhor. Até lá, e passe bem!”
[VI]
“Não consigo compreender essa história”, respondi. “É com certeza um caso muito misterioso.”
“Em regra7, os casos misteriosos são normalmente os fáceis de serem resolvidos. Os casos que parecem simples são freqüentemente os mais difíceis.”
“E o que você está pensando em fazer, então?”, perguntei.
“Francamente, estou pensando em fumar. Vou fazer isso durante cerca de uma hora, enquanto reflito sobre esse caso.”
Holmes sentou-se recolhidamente em sua cadeira e acendeu seu cachimbo. Curvado sobre si mesmo, de olhos fechados, seus joelhos chegavam perto de seu nariz, curvo como o de uma águia. Deixei-o então sozinho por algum tempo, até que, de repente, ele levantou-se num sobressalto e, decidido, me disse:
“Venha comigo, Watson. Há um grande violinista, Sarasate, que se apresenta esta noite na cidade, no Teatro Saint James. Reparei que há muita música alemã no programa, que é mais do meu gosto do que a italiana ou a francesa. Tenho certeza de que você poderá, durante algumas horas, se esquecer um pouco de seus pacientes, não é mesmo?”
“Não há problema. Tenho poucas coisas a fazer hoje”, disse.
“Então vista seu chapéu, seu casaco, e me acompanhe.
Primeiro, vamos fazer o caminho da Praça Coburg, onde nosso amigo Wilson tem sua casa de penhores. Eu quero dar uma passada de olhos em toda a vizinhança do Sr. Wilson.”
Fomos então pelo metrô até Aldersgate. A partir daí, caminhamos para a Praça Coburg, onde logo avistamos a loja de Wilson. Ela ocupava um dos muitos sobrados do local, todos dando logo a impressão de serem malconservados e sujos. Sherlock Holmes parou à frente da loja e a examinou inteira, cuidadosamente. A seguir ele caminhou lentamente pela rua, remontando até a esquina e examinando todas as casas vizinhas. Então ele retornou à loja de Wilson e bateu com sua bengala na calçada, por três vezes. Por fim, ele encaminhou-se subitamente à entrada da loja e bateu à porta. Imediatamente ela foi aberta por um jovem bem barbeado, de olhar aceso e esperto, que o convidou a entrar.
‘“Muito obrigado’, disse Holmes, ‘eu apenas gostaria de lhe perguntar como faço para ir daqui ao teatro Strand.”’
“É simples: caminhe três quarteirões e vire à direita, depois caminhe mais quatro e vire à esquerda”, respondeu prontamente o jovem, e fechou a seguir a porta.
‘“Rapaz muitíssimo vivo, esse’, disse-me Holmes, enquanto partíamos caminhando. ‘Ele é, na minha opinião, um dos quatro homens mais espertos que há em toda a cidade de Londres — e pela sua ousadia talvez mereça até o terceiro lugar. Eu já soube, antes, algumas coisas dele.’”
‘“Aparentemente, o Sr. Vincent Spaulding tem um importante papel nesse mistério da Sociedade dos Ruivos’, eu disse. ‘Suponho que você tenha batido à porta da loja a fim de poder conhecê-lo, não?’”
“Não quis ver a ele, propriamente.”
“Então o que você quis ver?”
“Os joelhos das calças dele.”
“Como assim? O que você viu neles?”
“Exatamente aquilo que eu esperava ver.”
“E por que bateu com sua bengala sobre a calçada?”
“Meu caro Dr. Watson, agora é hora de observar, não de conversar. Note que nós estamos em território inimigo, e que precisamos ser cuidadosos. Vamos dar apenas mais uma olhada nas redondezas.”
Dobramos a esquina e chegamos a uma rua muito
movimentada, que contrastava inteiramente com a rua em que se situava a loja do Sr. Wilson. Havia muito tráfego e um fluxo constante de pessoas que passavam apressadas por ela.
“Deixe-me ver bem isso”, disse Holmes, ficando de pé na esquina, parado, e examinando toda aquela rua. “Gostaria de me lembrar mais tarde da exata ordem dos edifícios desta rua. Sabe, é um passatempo meu adquirir um conhecimento exato das ruas de Londres. Bem, em primeiro lugar há ali uma tabacaria, e depois a pequena loja de jornais, e a seguir o Banco da Cidade, o restaurante vegetariano, etc. Muito bem, acho que fizemos bastante bem nosso trabalho, e eu vi exatamente aquilo que esperava ver. Portanto, está na hora de comermos um lanche e tomar um café, e a seguir ir ouvir aquele violinista de que lhe falei. Na terra dos violinos, tudo é doçura, delicadeza e harmonia, e nela não há clientes de cabelos ruivos para nos aborrecer com as suas bobagens.”
[VII]
para a sua casa”, ele disse ao sairmos do teatro.
“É verdade, eu gostaria de ir para casa”, respondi.
“Eu, da minha parte, tenho alguns afazeres que me vão tomar algumas horas. Ouça, esse caso da Praça Coburg é muito sério. Alguém planejou um crime tremendo. Acredito que ainda teremos tempo de impedir que ele aconteça. Ocorre que hoje é sábado, e isso na verdade vai complicar ainda mais as coisas. Eu vou precisar do seu auxílio esta noite, Watson.”
“A que horas nos encontramos?”, perguntei-lhe prontamente.
“Às dez horas está bem. Acredito que teremos então tempo suficiente.”
“Está acertado. Estarei no seu apartamento às dez.”
“Muito bem. Devo dizer também, Doutor, que talvez haja um certo perigo no que vamos fazer. Não se esqueça, portanto, de trazer consigo seu revólver.” E então Holmes sorriu, virou-se e foi embora, desaparecendo rapidamente na multidão.
Bem, espero não ser menos inteligente que os meus semelhantes, mas devo dizer que, sempre que trabalhava com Sherlock Holmes, sentia-me oprimido pela consciência de minha própria estupidez. Sentia-me, de fato, muito inferior a ele. Eu ouvira o mesmo que ele havia ouvido, vira exatamente o mesmo que ele havia visto e, mesmo assim, suas palavras tornavam evidente que não apenas ele já sabia o que se havia passado, como também aquilo que estava prestes a acontecer. E, para mim, todo o caso continuava ainda muito obscuro. Enquanto fazia o caminho de casa, refleti sobre toda a história do Sr. Wilson, repassando-a do início ao fim, mas não consegui depreender o sentido que ela guardava. Afinal, aonde é que iríamos naquela mesma noite, e por que é que eu precisava levar comigo meu revólver? Em meio a minhas muitas dúvidas, a única impressão que permanecia clara era a de que o ajudante do Sr. Wilson era uma pessoa temível, capaz de tudo, e essa impressão também me vinha, afinal, da maneira como Holmes se referia a ele.
Já passava das nove horas quando saí de casa, atravessei o parque e segui pela Rua Oxford até chegar ao apartamento de Holmes. Já no corredor, ouvi vozes vindo de cima, e, ao entrar no quarto de Holmes, encontrei-o numa conversa animada com dois homens. Um deles, reconheci-o como sendo Peter Jones, o inspetor oficial da polícia. O outro, que eu desconhecia, era um homem de rosto magro e triste, que portava um chapéu negro e estava metido numa respeitável sobrecasaca.
“Bem, nosso grupo parece estar completo”, disse Holmes, vestindo imediatamente seu casaco e seu chapéu. “Watson, creio que você já conhece o Sr. Jones, da Scotland Yard. Permita que eu lhe apresente agora o Sr. Merryweather, que vai nos acompanhar na aventura desta noite.”
“Eu espero que a nossa aventura não se revele, ao final de contas, uma aventura insana”, disse o Sr. Merryweather, com uma certa descrença.
“O senhor pode confiar muito no Sr. Holmes”, disse ao Sr. Merryweather o agente da polícia, Peter Jones. “Sherlock Holmes tem seus próprios métodos de trabalho, que são na minha opinião um pouco teóricos e às vezes fantásticos demais. Mas ele é um excelente detetive e sei que não vai decepcioná-lo. Sei também que ele não vai se importar com o fato de eu exprimir, deste modo, minha opinião sobre o seu trabalho.”
“Ora, se o senhor diz essas coisas, Sr. Jones, está tudo perfeito”, disse o Sr. Merryweather. “O que lamento é que hoje é sábado, e esta é a primeira noite de um sábado em que, em vinte e sete anos, deixo de jogar cartas habitualmente com meus amigos”.
[VIII]
Sherlock Holmes não perdeu a oportunidade de comentar com humor o que dissera num tom de lamento o Sr. Merryweather: “Eu acho que o senhor haverá de jogar esta noite um jogo muito mais interessante do que o seu carteado14 habitual”, disse. “O senhor vai ganhar neste jogo uma quantia de dinheiro muito maior, Sr. Merryweather. E você, Jones, vai finalmente capturar o homem que está procurando há tanto tempo.”
“Sim, John Clay, o grande ladrão, falsário e assassino!”, disse Jones. “Ele é bastante jovem, Sr. Merryweather, mas é o homem mais astuto em sua profissão. Ele é, sem dúvida alguma, um homem excepcional! O seu avô era um nobre, um duque da Casa Real, e o neto estudou na Universidade de Oxford! A sua mente é tão ágil quanto os seus dedos, e, apesar de eu ter encontrado muitos sinais de seus crimes, nunca fui capaz de pôr minhas mãos nele. Há anos que o persigo, mas nunca o vi.”
“Espero que eu tenha o prazer de apresentá-lo esta noite a você, Jones”, disse Holmes. “Bem, agora já passa das dez, e é preciso que comecemos nosso trabalho. Proponho que façamos o seguinte: vocês dois apanham o primeiro tílburi, e eu e Watson os seguimos no segundo, certo?”
O percurso foi longo, e durante a viagem Holmes não falou muito. Explicou-me, porém, que o Sr. Merryweather era diretor do Banco da Cidade e que, portanto, estava muitíssimo interessado na aventura daquela noite. Disse-me também que havia chamado Jones porque julgou que seria melhor ter a companhia de um agente da Scotland Yard. Holmes considerava o agente policial, entretanto, um completo imbecil em sua profissão.
Finalmente, chegamos a uma rua movimentada, a mesma que havíamos visitado pela manhã. Despachamos os nossos tílburis e fomos então diretamente para a frente do Banco da Cidade. Seguindo o Sr. Merryweather, passamos por um corredor estreito e por uma porta lateral, que ele nos abriu com suas próprias chaves, e entramos no edifício.
Passamos por outro corredor que terminava numa enorme porta de ferro, que também nos foi aberta pelo Sr. Merryweather. O diretor do Banco acendeu uma lanterna e então nos conduziu por outra passagem, escura e úmida; depois de abrir uma última porta, entramos num porão fundo, todo feito de pedras, onde havia muitos caixões empilhados uns sobre os outros.
“O senhor está seguramente protegido de qualquer ladrão que tente chegar aqui vindo de cima”, disse Holmes.
“E também de baixo”, disse o Sr. Merryweather, batendo fortemente com sua bengala sobre o chão de pedra a seus pés.
“Pelos céus, o chão soa como se nenhuma terra houvesse embaixo dele!”
“Eu devo de fato pedir ao senhor que fale mais baixo”, disse Holmes de um modo severo. “O senhor quase pôs a perder todo o nosso plano com sua atitude. Eu lhe peço que se controle e que se sente sobre um desses caixões. Espere pacientemente, sim?”
O Sr. Merryweather obedeceu ao pedido, e Holmes agachouse e começou a examinar com sua lupa, cuidadosamente, as pedras do solo. Não se demorou nisso e, logo a seguir, ergueu-se novamente e guardou a lupa em seu bolso.
“Vamos ter de esperar pelo menos uma hora”, ele disse, “pois eles provavelmente não tentarão fazer nada antes que o Sr. Wilson vá dormir. Mas, uma vez que ele tenha ido para o seu quarto, eles não perderão mais nenhum minuto, isso porque, se eles agirem rápido, terão conseqüentemente mais tempo para escapar. É claro que você percebe, Dr. Watson, que estamos na parte subterrânea do grande Banco da Cidade de Londres. O Sr. Merryweather pode explicar bem a você por que razão os ladrões de Londres estão todos interessadíssimos em entrar, no momento, neste porão.”
“É por causa do ouro francês que está guardado aqui”, disse Merryweather.
“Ouro francês?”, perguntei.
“Sim. Tivemos a oportunidade, há dois meses, de fortalecer os recursos de nosso Banco, e fizemos, com esse objetivo, um empréstimo de 30.000 napoleões do Banco da França. O dinheiro ainda está guardado nestes mesmos caixões sobre os quais estamos sentados. Nossas reservas de dinheiro são atualmente muito maiores do que as que costumamos guardar”, disse Merryweather.
“Está na hora de prepararmos nossos planos”, disse Holmes.
“Creio que dentro de uma hora teremos um pouco de ação por aqui. Precisamos apagar as luzes e permanecer no escuro, em silêncio, bem escondidos detrás dessas caixas. Quando eles chegarem, aguardem que eu tome a iniciativa, entendido? Se for preciso, vou ofuscar os olhos deles com a luz, e saltaremos todos então rapidamente sobre eles. Se eles atirarem, não tenha nenhum receio de abatê-los, Watson, e use imediatamente o seu revólver.”
[IX]
“Só há uma maneira de eles escaparem daqui”, disse Holmes.
“Voltando pelo túnel para a loja do Sr. Wilson. Espero que você tenha feito o que lhe pedi, Jones.”
“Não se preocupe, Holmes, eu enviei um inspetor e dois policiais para ficarem de prontidão18 à porta da loja do Sr. Wilson”, respondeu Jones.
Holmes, com uma expressão mais tranqüila, disse: “Então conseguimos bloquear todas as saídas. Devemos, agora, ficar em absoluto silêncio e esperar.”
O tempo dava-me, então, a impressão de passar cada vez mais devagar. Embora não houvesse transcorrido, desde que apagamos as luzes, muito mais do que uma hora, eu já me sentia como se a noite inteira tivesse passado, e como se em breve a luz do sol viesse de novo nos despertar e cobrir a cidade. Sentia minhas pernas extremamente cansadas, e, para agravar meu desconforto, tinha receio de mudar a posição de meu corpo e, com isso, produzir algum ruído que pusesse toda a estratégia de Holmes a perder. Então, subitamente, vi um pequeno fio de luz se projetar no solo do porão. No início, era muito fraco e pequeno, mas logoganhou intensidade e se estendeu pelo chão. A luz vinha de um dos lados de uma das pedras que compunham o piso, e todos olhávamos para ela com os olhos fixos e a respiração presa. Nos primeiros momentos que se seguiram, foi como se tudo parasse; de repente, ouvimos um som alto e ruidoso: uma das pedras do piso havia sido erguida e removida para um dos lados.
Víamos agora uma luz forte que saía do buraco aberto no piso do porão. Logo a seguir, a cabeça de um homem aparecia, saindo daquele buraco do piso: era um jovem. Todos nós nos controlávamos aguardando a ação de Holmes. Com esforço, o jovem pôs suas mãos nas bordas do buraco, e com agilidade, firmando-se no solo, conseguiu erguer todo seu corpo para fora do buraco. Num gesto rápido, ele se pôs de pé e olhou ao redor, sem que nos conseguisse ver, e ficou por um momento ao lado do buraco de onde saíra. Então agachou-se, inclinou se e, com seus braços, ajudou outro homem a subir e sair para fora daquele buraco. Esse segundo homem tinha os cabelos ruivos e brilhantes como os do Sr. Wilson.
“Pode vir, está tudo calmo. Você tem com você os sacos e as ferramentas?”, sussurrava ainda o primeiro homem, quando Holmes saltou sobre ele, pegando-o pela gola. “Pelos céus! Depressa, Archie, fuja!”, foi a reação que ele teve, gritando. O segundo homem atirou-se de volta ao buraco, antes que Jones pusesse as mãos nele. O primeiro homem tinha ainda um revólver nas mãos, mas Holmes desarmou-o imediatamente, atirando a arma ao chão com um gesto ágil de sua bengala.
“Não adianta, John Clay”, disse Holmes, controlando a situação. “Você não tem nenhuma chance de escapar.”
“É, estou percebendo isso”, respondeu friamente o outro, “mas acho que, por outro lado, meu companheiro já conseguiu fugir neste momento.”
“Você pode ficar tranqüilo quanto a ele”, disse Holmes, “há três homens da polícia que o esperam à porta da casa do Sr. Wilson.”
“Não diga! Vejo que você preparou tudo muito bem. Devo dar-lhe os meus parabéns.”
“Eu o cumprimento também”, disse Holmes. “Sua idéia da Sociedade dos Ruivos foi muito criativa e inteligente.”
“Você vai encontrar seu companheiro daqui a pouco”, interveio Jones. “Ele é mais ágil do que eu para passar por um túnel. Vamos, estenda suas mãos para as algemas.”
“Espero que o senhor não me toque com suas mãos imundas”, disse John Clay. “Creio que não sabe, mas tenho sangue real em minhas veias. Tenha a bondade, pois, de dizer ‘Sir’ e ‘por favor’ ao me dirigir a palavra.” Jones olhou-o com escárnio20 e levou-o para fora do porão, e nós os seguimos.
“Realmente, Sr. Holmes”, disse o Sr. Merryweather, “não sei como o Banco pode recompensá-lo. Está provado que o senhor descobriu e derrotou dois criminosos perigosíssimos, evitando um roubo que com certeza estaria entre os mais audaciosos já praticados em Londres. O senhor nos poupou de uma grande perda.”
“Para mim, foi acima de tudo um prazer capturar John Clay”, disse Holmes. “É verdade que tive alguma despesa para resolver este caso, mas estou certo de que o Banco irá restituir o que gastei. Já me dou por satisfeito com isso, e pelo fato de ter ouvido a extraordinária história da Sociedade dos Ruivos.”
[X]
“Você vê, meu caro Watson”, dizia-me Sherlock Holmes na manhã seguinte, quando tomávamos um copo de uísque em seu apartamento da Rua Baker, “estava claro, desde o início, que essa história de copiar verbetes da Enciclopédia Britânica tinha, como único objetivo, afastar o Sr. Wilson de sua loja durante algumas horas todos os dias. Não há dúvida de que essa foi uma maneira muito curiosa de livrar-se do Sr. Wilson, mas na verdade seria difícil imaginar outro modo mais engenhoso21 de conseguir o seu afastamento. Com certeza, a idéia da tal Sociedade dos Ruivos ocorreu a John Clay pelo fato de tanto o seu companheiro quanto o Sr. Wilson terem cabelos ruivos. Os quatro pounds que tiveram de pagar por semana ao Sr. Wilson, em troca de seu trabalho de copista na Sociedade, eram um excelente atrativo para ele, além de ser uma quantia irrisória para eles, uma vez que estavam planejando um crime que lhes daria muito mais dinheiro.”
‘“A primeira coisa que despertou minha suspeita’, prosseguiu, ‘foi o fato de o empregado do Sr. Wilson ter aceitado trabalhar recebendo apenas a metade do salário a que teria direito. Estava claro assim que ele deveria ter uma razão muito forte para querer ficar nesse emprego, sobretudo sendo ele, como reconhecia o próprio Sr. Wilson, uma pessoa muito capacitada e que poderia trabalhar em outro local.’”
“Mas como pôde você deduzir qual era a motivação do ajudante do Sr. Wilson?”, perguntei.
“Se houvesse mulheres na mesma casa, eu logo suspeitaria de uma razão vulgar para o desejo do empregado de permanecer ali. Entretanto, nada disso havia. Por outro lado, os negócios do Sr. Wilson são muito modestos, e portanto não havia nada em sua casa que pudesse atrair os ladrões ou explicar as despesas e os longos preparativos que eles estavam fazendo. Concluí então que eles só poderiam ter interesse em algo que estivesse fora da casa. O que poderia ser? O Sr. Wilson observou que o seu ajudante se interessava muito por fotografia, e que passava muito tempo no porão da casa, revelando seus negativos. Pensei: há algo de estranho nessa permanência de seu empregado no porão. Era muito provável que ele estivesse fazendo algo às escondidas, talvez escavando um túnel que levasse a outro lugar.”
“Já tinha chegado a essa conclusão quando fomos visitar a loja do Sr. Wilson. Sei que surpreendi você, ao bater algumas vezes com minha bengala na calçada em frente à loja. Na verdade eu estava tentando descobrir se o túnel estava sendo construído na direção da frente da loja, ou se conduzia para os fundos da casa. Quando toquei a campainha da loja e conversei com o empregado, o que me interessava não era vê-lo pessoalmente, mas sim ver as marcas de sujeira nos joelhos de suas calças, marcas que comprovavam que eles estavam sempre ajoelhados escavando um túnel no porão da casa. Pois bem, restava ainda descobrir por que razão eles estavam construindo um túnel. Quando dobramos a esquina, vi que o Banco da Cidade era vizinho, pelos fundos do terreno, da loja do Sr. Wilson. Percebi imediatamente que essa era a motivação dos ladrões: construir um túnel que levasse ao Banco. Quando você foi para casa, depois do concerto de música, eu fui à Scotland Yard e também à diretoria do Banco, e o resultado de tudo isso você mesmo viu.”
“Sim, mas diga-me: como você adivinhou que os ladrões iam tentar assaltar o Banco ontem à noite?”, perguntei-lhe.
“Bem, quando eles deram fim ao escritório da Sociedade dos Ruivos, isso significava que eles não precisavam mais afastar o Sr. Wilson de sua loja. Em outras palavras, eles já tinham concluído o túnel, que era o trabalho que faziam no porão da casa. Porém, eles tinham necessidade de agir rapidamente, pois corriam o risco de o túnel vir a ser descoberto e de o dinheiro vir a ser removido para um depósito em outro lugar. O melhor dia para o roubo seria logicamente o sábado, pois assim teriam dois dias para fugir, já que os bancos estão sempre fechados aos domingos.”
“Você compreendeu tudo magnificamente!, exclamei com admiração. “É uma seqüência de eventos bastante longa, mas todos os elos se ligam perfeitamente.”
“Esses pequenos problemas sempre me interessaram, e no fundo são bastante elementares. Eles me ajudam a fugir do tédio”, respondeu-me Holmes. “Sinto-o sempre ao redor de mim, e passo minha vida tentando escapar aos lugares-comuns da existência.”
“Você é um benfeitor da raça humana”, eu lhe disse.
E ele, dando de ombros, respondeu: “Bem, afinal de contas, talvez isso tenha alguma utilidade. ‘L’homme c’est rien — l’oeuvre c’est tout’ (tradução: O homem não é nada.), como Gustave Flaubert escreveu a George Sand.”
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